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04/02/2010 Equipe Mais uma polêmica no Enem: quais os critérios para avaliar a redação?
Alguns estudantes que prestaram o Enem estão contestando, inclusive judicialmente, as notas de suas redações. Como prova de que ocorreram equívocos por parte dos avaliadores, apresentam as altas notas que obtiveram em outros exames e até pareceres de professores de português, que leram e avaliaram positivamente os rascunhos das produções desses alunos.
A questão é bem complicada, pois a redação será o primeiro critério de desempate no SiSU - Sistema de Seleção Unificada. Para quem não sabe, o SiSU é o sistema informatizado através do qual serão selecionados os futuros alunos das instituições públicas que optaram pelo Enem.
Como resolver esse impasse? Quem está com a razão? A resposta não é tão simples como pode parecer...
Embora existam sim parâmetros objetivos para avaliar uma redação, como: não fugir do tema e do gênero propostos, não cometer erros ortográficos e/ou gramaticais gritantes, manter um texto coeso, com progressão temática, etc., há muitos outros que dizem respeito ao contexto de produção e à subjetividade do corretor.
Sem desconsiderar que podem ter havido problemas de correção no último Enem, como esses apontados pelos candidatos, é importante pensarmos um pouco sobre a subjetividade que envolve a escrita.
Certamente, muitos já viveram a experiência de não conseguir desenvolver bem um texto quando o tema proposto é pouco conhecido. Nessas horas, geralmente, perdemos muito da desenvoltura, pois nos faltam informações, repertório e até a segurança necessária para uma boa redação. O mesmo acontece quando o tema surpreende pela estranheza, exigindo muita reflexão em um momento tenso como é a situação do vestibular. Por vezes, falta ao candidato tempo para digerir a proposta, organizar as ideias, rascunhar, até chegar a um produto final não só com acabamento, mas que se diferencie pela criatividade. Ou seja: escrever bem não é um valor absoluto! Não se trata de um desenvolvimento linear e há muitas circunstâncias que podem ser determinantes – facilitadoras ou não – para uma redação de qualidade.
E há também a subjetividade do corretor. Obviamente, aqui, todos esperam que aqueles critérios mais objetivos sejam observados, e que o grupo de corretores seja treinado para segui-los. Não se pode zerar uma redação em que o estudante não tenha saído do tema e do gênero, cometido erros graves de português e não tenha manifestado opiniões incoerentes, preconceituosas ou que firam valores universais. Porém, textos com começo, meio e fim, com formatos e abordagem do tema previsíveis podem sim perder pontos, enquanto aqueles que mostram mais do que competência para escrever ganham.
Resumo da ópera: não basta dominar as especificidades do gênero argumentativo-dissertativo, solicitado nos vestibulares. Embora esse domínio seja fundamental, depois de uma pilha de mesmices, os corretores esperam ser surpreendidos por textos que revelem autoria; isto é, apresentem densidade no desenvolvimento das ideias, com liberdade e vivacidade. E essas qualidades não estão presentes nos modelos de redação disseminados na preparação para o vestibular.
Não há de antemão, portanto, um lado que esteja certo nesta polêmica, pois tanto a produção de um texto quanto sua leitura e avaliação fazem parte de um processo delicado: trata-se de um encontro entre autor e leitor pautado na tarefa de avaliar para classificar, selecionar. E sem a possibilidade de um diálogo que dê conta de conferir o que cada um compreendeu a respeito do discurso do outro.
Neste momento em que tantas mudanças têm sido propostas nos vestibulares, não seria o caso de também se rever o papel da redação?
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